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PLURAL: os textos de Juliana Petermann e Eni Celidonio

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Juliana Petermann 
Professora universitária

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Na semana passada, mais uma vez, eu deixei de frequentar um grupo de WhatsApp. O motivo? As fake news. A notícia que recebi por lá tinha o sugestivo título "Golpe de Mestre". Falava sobre um suposto "PIVFI - Parque Industrial de Vacinas" que "só entra quem estiver autorizado" que "vai assombrar o mundo" que "foi feito em sigilo" que "agora é tarde os petistas, esquerdistas e centro-esquerdistas só agora estão sabendo" e que blá blá blá. Minha primeira reação, fruto de um grande cansaço, foi questionar como alguém, em sã consciência, acredita nisso.

LIMITE

Diante de todo o contexto caótico do Brasil minha paciência com fake news chegou ao limite, a ponto de não conseguir fazer vista grossa. Perder a paciência não significa, no entanto, deixar de procurar as razões para esse fenômeno. Listo algumas que necessitariam, obviamente, de uma discussão mais profunda: 1) a ausência de alfabetização midiática: não fomos ensinados nem a ver TV de forma crítica e agora manejamos com dificuldade as possibilidades digitais; 2) a existência de um viés de confirmação: a tendência de buscarmos por exemplos que confirmem uma crença que já possuímos, o que facilita o convencimento; 3) a falta de medidas eficazes que coíbam a circulação de textos falsos nas redes sociais: segundo o Relatório de Notícias Digitais 2020 do Instituto Reuters, no Brasil, o Facebook e o WhatsApp são as principais plataformas de difusão de conteúdos falsos e são também as que mais servem de fonte de informação.

AH SE FOSSE VERDADE

Depois penso como seria bom se fosse verdade: já imaginou se fossemos surpreendidos com a notícia de que o Brasil colocou em pé, em um ano, um complexo industrial de vacinas? Já imaginou se nosso governo tivesse apoiado a pesquisa pró-vacina desde o início? E se todo o descaso não passasse de um plano para nos brindar com a solução, num verdadeiro golpe de mestre? Ou uma grande pegadinha do Malandro. Mas não. Não se trata disso. Não temos "PIVFI", não temos vacina para toda a população, não temos sequer comprometimento, sequer solidariedade.

Temos os piores índices do mundo e temos narrativas tão absurdas quanto essa, circulando pelos grupos, especialmente pelos grupos de família. Lá onde as relações estão enredadas em afetos, mas também em melindres. Onde a gente sempre acha que a discussão não vale a pena. No meu caso, antes de deixar o grupo, expliquei o motivo. Porque deixar para lá talvez não seja a melhor solução: o afeto também convence e, às vezes, medidas mais drásticas também são didáticas..

Ouçam seus pais, crianças
Eni Celidonio 
Professora universitária

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Os nossos pais falam, chamam a atenção, explicam, mas não adianta... A gente só entende quando vira pai ou mãe, ou quando cai na armadilha. Meu pai tinha pavor de apelido. Ele dizia que costume de casa vai à rua, e um dia ficaríamos em situação constrangedora, chamando um advogado de doutor Nenê. Vejam bem, não falo daqueles que são usados para determinar um defeito, ou uma condição, tipo "quatro olhos", "baleia" etc. Falo daqueles que a gente traz da infância, geralmente como um irmão mais novos nos chama, os pais assimilam, os parentes utilizam e pronto! Está inaugurada uma nova identidade.

QUEM?

Ao lado da casa dos meus pais, morava uma família que, até hoje, eu não sei o nome das pessoas. Era Cacau, Ica, Dedê, Vivi, e por aí ia. Havia um time inteiro na minha rua, com apelidos os mais variados. Mas, sério, eu nunca havia visto um lugar com tantos apelidos como Santa Maria! Só de Neca e de Mano conheço um monte. Não falo da maneira de reduzir os substantivos, como "refri" para refrigerante, "zela" para zelador... Não! Falo de apelido mesmo, de tal maneira que, quando a gente utiliza o nome da criatura, surge a pergunta: quem? Exemplo simples: meu amigo Adalberto. Sempre que falo nele com alguém, vem o: "Ah, o Toco"!

Eu, como sou aquela que nem viu onde colocou a cabeça, peguei a mania por osmose. Aqui no meu prédio tem a Noca, Na UFSM, no meu departamento, tem a Tuca; No CAL tinha o Titi... É um tal de apelido que às vezes a gente nem sabe mais com quem está falando.

Pois bem.... Os padrinhos da minha filha, meus vizinhos queridos, primeiros amigos que tive aqui na cidade, têm três filhos: a Rita, a Maristela e o Wolnei. A Rita sempre foi a Rita, mas a Maristela sempre foi Dedé e o Wolnei sempre foi o Preto. Sempre! Só que enquanto eles eram pequenos, tudo bem, mas hoje eles são médicos, não pega bem, né? Eu chamo meu médico de PA, e não é que um dia, para marcar uma consulta, eu ligo para o consultório e peço para marcar uma hora com o doutor PA?

A menina me disse que não tinha nenhum PA naquele consultório. Agradeci, deixei passar uns dias e tornei a ligar, repetindo "doutor Paulo Afonso, doutor Paulo Afonso, doutor Paulo Afonso". Triste!

E chega o momento de fazer aqueles exames que só as mulheres fazem: os malditos preventivos. Marquei a consulta e fiz todos os exames pedidos. Fui fazer a mamografia, que chamo de misto quente de mama, (só as mulheres que já fizeram entenderão) e começa a anamnese: nome, idade, quando surgiu a primeira menstruação, caso de câncer na família, já operou as mamas?

- Já, respondi.
- Qual delas?
 - Não lembro, tem trinta anos, mas o doutor Paulo Afonso deve lembrar.
- Eu disse Paulo Afonso! Não disse PA! Fiquei orgulhosa de mim! Alvíssaras!
E a menina continuou: fuma? Alguma doença como diabetes?
- Sim, tenho diabetes.
- E quem trata a senhora?
- A Dedé...

TÓÓÓÓÓÓÓÓÓIIIIIINNNNNN!!

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